quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Comentário sobre O centauro no jardim, de Moacyr Scliar



A obra literária O centauro no jardim traz a história de um dos filhos de uma família de origem judaica, que nasceu diferente dos outros filhos. Era um centauro. Por ser assim, sua mãe ficou traumatizada por vários dias depois do parto, mas a família toda se dedicou a cuidá-lo e foi amado por todos. Cuidando para não ser visto pelos vizinhos, cresceu sem a liberdade de ir e vir e se dedicou a estudar revelando-se muito inteligente.
Mais tarde, depois de ter fugido de casa, cansado pela falta de poder valer-se por si só e conhecer outros lugares, foi parar num circo, onde despertou o interesse da dona do circo e também seu horror quando ela descobriu que era um centauro e não um homem. Sua vida continuou, encontrou uma centaura, filha de um fazendeiro, ambos se uniram e foram morar juntos. Tiveram a oportunidade de se submeter a uma operação que os transformou em pessoas normais, porém seus pés eram patas de cavalo. Tiveram filhos gêmeos normais.
Mas, ao parecer, Guedali e Tita, ex-centauros, ainda tinham instintos animais e sentiam saudades de andar pelo mato, correr livremente sem usar os sapatos especiais que escondiam suas patas. Patas que, com o uso de sapatos, foram se transformando em pés de gente.
Há ainda o aparecimento de outro centauro jovem; a esfinge, metade mulher e metade leoa que impede a reversão da operação que Guedali queria fazer depois de se separar da mulher. A história termina com Guedali num restaurante tunisiano, rodeado de amigos, da mulher e dos filhos, com sua vida retomada e tranqüila, pensando se contaria aos seus amigos a verdade sobre sua vida.
O autor, descendente de judeus, aproveita sua visão sobre os costumes judeus para compor seu texto literário com seres fantásticos. Desse modo, a história de amor e de aspectos religiosos judaicos vai se desenrolando. Podemos ver como a religião supera qualquer empecilho para ser seguida, como no caso da circuncisão que o mohel teve que fazer no centaurinho, e também mais tarde ao ser iniciado na religião através dos ritos necessários.
Em relação à vida pessoal do centauro e da centaura, ambos querem uma vida normal, casar, ter filhos, posses, ou seja, as diferenças estão mais na aparência, o que torna a historia mais verossímil para o leitor que passa a compreender todas as situações estranhas que lá ocorrem.
A própria cirurgia a que se submeteram para a mudança da aparência física também conta com o conhecimento do autor sobre Medicina, o que também ajuda na aceitação do relato.
Ao colocar centauros como personagens principais, creio que o autor quis personificar a força de uma raça, sua vontade de viver apesar das dificuldades da vida e, finalmente, o êxito depois dos sofrimentos. Ao incluir uma esfinge, sinônimo de uma figura que permanece através do tempo a capaz de guardar segredos, simbolizaria justamente a impenetrabilidade, a resistência, a força e a garra de uma religião que é parte ativa na vida dos judeus.
Os seres que o autor utiliza na sua história são representantes de seu imaginário e que vem a representar, quem sabe, sua própria visão da religião e da raça judaica. Afinal, uma raça que se transformou através dos tempos, mas que ao mesmo tempo, preserva seus costumes e sente a saudade de voltar a sua terra, tal como os centauros sentem a vontade de correr pelos campos, livres.
Uma história fantástica com personagens fantásticos que limitam com o real.