O filho vem trazer uma nova riqueza ao casamento. É mesmo, muitas vezes, a sua única riqueza, quando a união é espiritualmente pobre. E os casamentos espiritualmente pobres são os daqueles esposos vulgares, que nada mais procuram na sua união do que uma felicidade terra a terra.
São casamentos sem nobreza, porque toda a nobreza provém de que o homem se supere, ao consagrar-se a uma causa que o engrandece. [...]. O casamento, como qualquer obra humana, enobrece-se ao visar algo de mais elevado do que a mera satisfação pessoal. O amor colhe a sua grandeza do facto de os que se amam julgarem encontrar nele uma perfeição ideal, de terem a impressão de que se vão transcender a si próprios na sua união. Toda a literatura clássica sobre o amor repousa neste pensamento, e a doutrina cristã do casamento, sobre o carácter sacramental do matrimónio cristão, sanciona esta aspiração, dando aos homens a garantia de que o próprio Deus intervém nele para lhes permitir realizar o seu ideal de perfeição no amor. Acrescenta mesmo que, pelo sacramento, um mistério de perfeição divina se realizará neles, em e pela sua união.
Porém, um grande número de esposos mantém-se inconsciente desta grandeza. São casamentos pobres; união de almas pobres, incapazes de se elevar à pureza do amor. O facto de que um homem procure ser feliz, sem outro ideal, nada tem de nobre. Quando o homem põe o seu fim em si mesmo, permanece limitado a si mesmo e, ele mesmo, pouco representa. A sua grandeza provém precisamente de ser capaz de se transcender, deixando-se absorver por um fim que o ultrapassa. Os casamentos pobres encontram no filho um elemento de riqueza.
É pelo filho que o homem mais facilmente se supera. O amor dos pais é a forma de amar mais espontaneamente desinteressada. No amor maternal frequentemente se observa este desinteresse. E embora o amor paternal se manifeste mais raramente em toda a sua pureza, muitas vezes se ouve dizer, contudo, a homens que são infelizes no lar: “Se não fosse pelos pequenos!…”
O amor dos pais é a única forma de amor natural inteiramente desinteressada, no sentido de que os pais identificam o bem dos filhos com o seu próprio bem, a ponto de encontrarem o seu próprio bem no dos filhos. É vulgar que os pais se sacrifiquem pelo bem-estar e felicidade dos filhos; isto dá-se entre pessoas que não manifestaram, fora disso, nenhuma aspiração moral superior. É que a felicidade dos filhos é a sua, porque os filhos são uma parte de si próprios. Ainda por esse motivo, a inveja não se manifesta entre pais e filhos ou, se alguma vez se manifesta, logo é tida por uma monstruosidade. Os pais sentem-se naturalmente orgulhosos e felizes pelos êxitos dos seus filhos, e os filhos pelos êxitos dos pais, como se fossem seus. Pais que foram sempre uns cábulas mostram-se orgulhosos com os êxitos dos seus filhos. Os laços de sangue criam uma solidariedade que quase constitui uma espécie de unidade física.
Mulheres mentirosas, egoístas, vaidosas, intrigantes enternecem pelo seu amor desinteressado quando falam dos seus filhos. É encantador falar dos filhos com as mães, porque logo se vê aflorar nelas uma pureza que nem sempre se encontra na sua vida. E, inclusive os pais, ao falar dos filhos, manifestam uma delicadeza de sentimentos que parece quase um milagre em corações de homens autoritários, violentos e secos.
Não é difícil compreender tudo isto pelo vínculo propriamente físico que liga os pais aos filhos. Os filhos são para os pais alguma coisa de si mesmos, a carne da sua carne, destacada deles para formar um ser diferente, mas que os continua, ao mesmo tempo, a eles próprios. Em toda a extensão da palavra, os pais continuam-se nos filhos. Neles está impressa a semelhança com os pais e os pais encontram-se a si próprios neles, física e moralmente. Os filhos fazem parte da sua vida; a felicidade dos filhos faz parte da sua; nos filhos, sobreviverão; e nos filhos podem aspirar a realizar uma vida melhor do que aquela que eles próprios realizaram. Quantos homens e quantas mulheres medíocres, que a vida desiludiu – porque se mostraram incapazes de a conduzir – aspiram a conseguir para os filhos uma existência mais bela do que a sua!
O desejo de uma obra que constitua a expressão da sua personalidade e que subsista quando ele um dia venha a desaparecer, é um desejo natural do homem. Talvez isto signifique uma ânsia de eternidade inerente ao ser dotado de inteligência; de qualquer maneira, é um desejo universal e bem característico do ser humano. Ora, a maior parte dos homens vive uma vida destituída de interesse, no decorrer da qual nada produz e em nada se salienta. Consegue unicamente subsistir. Porém, todos podem realizar e realizam uma grande obra, sempre que dão filhos ao mundo.
(Jacques Leclercq)
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