terça-feira, 14 de setembro de 2010

O pai ausente

 

Análise dos efeitos patológicos que o abandono da responsabilidade educativa do pai pode ter sobre o desenvolvimento dos filhos.
Tanto a criança como o adolescente sentem a necessidade de ambos os pais e, sobretudo, da vitalidade e do senso comum da mãe. À margem de toda e qualquer especulação ou polémica científica, bastaria que pai e mãe actuassem em comum e de forma criativa, que se completassem um ao outro espontaneamente e que tivessem em conta que nenhum deles pode ser substituído pelo outro. A presença activa do pai revela-se cada vez mais necessária para um crescimento equilibrado dos filhos (…).
Em épocas anteriores à nossa, os filhos dos camponeses e dos artesãos, que é o mesmo que dizer todas as crianças, tinham o pai sempre a seu lado e podiam observá-lo enquanto ele trabalhava. Quase sem darem por isso, absorviam o seu carácter e os seus ensinamentos. Depois, os ritmos intensos da vida industrial e pós-industrial, privaram-nos dessa constante, laboriosa e paciente figura educativa. Agora, o pai trabalha longe do espaço vital da família, num mundo que é alheio aos filhos, onde desenvolve uma actividade para eles completamente incompreensível (…).
O pai tem além disso que atender a outras necessidades durante o tempo livre, se não quiser ficar excluído da vida social, cultural e religiosa, para não falar do desporto, dos “hobbies” e das diversas associações a que pode estar ligado. Resulta daqui que, mesmo depois do trabalho, raras vezes está presente na infância e adolescência dos seus filhos. Considere-se ainda que tanto o “stress” da vida, como a concepção patriarcal (mais difundida do que se pensa), limitam ainda mais a difícil e desejada presença activa do pai. Quando muito, ser-lhe-á possível brincar um pouco à tarde com eles, ou exercer pessoalmente a sua autoridade, como única garantia da ordem doméstica, ao fim de um dia de trabalho. O pai precisa de sossego. Hércules está cansado, depois das suas brilhantes fadigas, e os filhos continuam confiados à exclusiva competência da mãe.
Com este tipo de relações familiares não se pode estabelecer entre os filhos e o pai nenhum “vínculo vital”. Com esta expressão, utilizada pelo fundador da medicina psicossomática alemã, Viktor von Weizsãcker, pretende-se definir esse vínculo único e imprescindível que é a base de toda a tarefa educativa.
Quando o marido é um pai ausente, a mulher sente-se impotente, incompreendida e insatisfeita, como mulher e como educadora. Em tais condições, é quase inevitável que o desenvolvimento dos filhos se retraia e sofra desvios. (…)
A mulher concentra então todas as suas energias egocêntricas sobre a criança ou sobre o adolescente, que se convertem deste modo em vítimas indefesas de uma situação opressiva. O filho perde a sua própria identidade e passa a ser simplesmente o refúgio, o consolo, a honra e coroa do insatisfeito amor de mãe: é o filho quem deve proporcionar-lhe o que não obtém no matrimónio.
(…) A mãe quer controlar toda a trajectória do filho sem perigos de qualquer tipo. Uma ideia fixa da sua saúde física, baseada num formalismo rigoroso (último refúgio das pessoas sem ânimo), vai modelando pouco a pouco o protótipo do filho mimado. Este, acostumado a preocupar-se sobretudo consigo mesmo, habitua-se, por exemplo, a dar uma importância desproporcionada à comida, que se converte num sistema de defesa contra a enfermidade. Boa saúde converte-se em sinónimo de estar gordo; segurança, eliminação de qualquer imprevisto. Estes curto-circuitos banais, mas contundentes, impedem a vitalidade e inibem o espírito de qualquer iniciativa tanto nos jovens como nas crianças.
A mãe, omnipresente, deve controlar tudo, decidir tudo, vigiar ansiosamente as ocupações dos filhos. A própria vocação destes deve satisfazer as concretas ambições da mãe que, com o rodar dos anos, continuará a intrometer-se nos assuntos íntimos do filho, que já não é um menino mas um adulto, talvez casado e com descendência. Este, por sua vez, não se atreve a exercer a sua autonomia responsável donde brota a maturidade, e continuará agarrado às saias da mãe, mas incapaz de a amar verdadeiramente.
Juan Batista Torelló, ensaio publicado na revista “Studi Cattolici”
Tirado de Cadernos Educação e Família, n.9, ano III

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